domingo, 5 de abril de 2015

Por que investir na brincadeira de faz de conta?

Esses dias ouvi de um adulto que a brincadeira era muito importante mas, que não era "qualquer brincadeira". Fiquei pensando se esse adulto sabe do que está falando, se ele pode analisar realmente sobre a importância da brincadeira e se reconhece o que verdadeiramente significa a frase "não qualquer brincadeira".

Desconfio que não sabe. Sem alardes ou culpa, nós, adultos, pouco entendemos sobre brincadeira ainda que tenhamos vivido a fase da infância e tenhamos nos constituído humanos porque pudemos brincar quando criança. Olhamos a criança brincando e já vamos pensando que é da sua natureza brincar. Certamente desconhecemos que ela aprendeu a brincar e foi com nossa preciosa ajuda.

É... é preciso brincar para se tornar ser humano. A brincadeira é o veículo, a forma, o suporte, a porta de acesso ao mundo humano e humanizado, sendo que ela permite a apropriação dos motivos e atividades humanos. Por isso estava certa a frase "não qualquer brincadeira". 

O problema de nós adultos é adulterar o sentido que a brincadeira tem para a criança. Se não encontrarmos um motivo útil para ela acontecer, negamo-lhe a importância. Mas por quê? Porque nos equivocamos redondamente ao considerarmos importantes apenas atividades "produtivas". No fim das contas há uma grande utilidade na brincadeira propriamente dita. Porém não no sentido utilitarista. 

A brincadeira infantil não é uma atividade produtiva. O motivo está no próprio processo. As ações e operações têm um fim em si mesmas. Assim, para a criança uma atividade lúdica não é adequada para alcançar objetivo algum. 


Sociedades menos desenvolvidas tecnologicamente conseguem inserir a criança nas atividades produtivas sem nenhum tipo de preparo especial. A brincadeira de papéis, então, surge no momento histórico em que há uma mudança no lugar da criança no sistema de relações sociais.

A criança da atualidade vive num mundo onde os processos de produção de bens se caracterizam cada vez mais complexos. A inserção da criança nesse mundo dá-se por mediações cada vez mais complexas. As crianças vivem grande parte da infância afastadas do trabalho dos adultos o que dá a ela uma desvantagem. Ela não fica sabendo como o mundo de objetos, instrumentos e bens é criado. O que ela vai fazer para se aproximar é brincar de faz de conta.


A brincadeira de faz de conta, no aspecto ontológico do ser humano, não surgiu espontaneamente; e sim, devido à educação, influência constante do adulto. 

O item mais importante na brincadeira de papéis é o homem e suas atividades. O mundo se descortina através do mundo das relações sociais, o que a leva a criança a agir como o adulto. Ela satisfaz sua necessidade na brincadeira, através de uma situação imaginária. Através do jogo o mundo das relações, que é complexo, fica acessível para a criança, isto é, possibilita-a ir para um nível mais elevado.  

Considerando que a brincadeira ocupa um lugar tão importante no desenvolvimento da inteligência e da personalidade da criança, concedendo-lhe acesso às qualidades humanas desejáveis (amizade, solidariedade, autocontrole, por exemplo) por que motivo tão pouco se investe para que a criança brinque cada vez mais e melhor?     


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