sexta-feira, 13 de maio de 2016

O que vejo quando observo uma criança?


Se por princípio nascemos todos diferentes, então devemos partir da premissa que cada criança aprende e se desenvolve de modo único. 

Como professora de bebês que estão com a idade de um a dois anos, reiteradamente dou-me conta que uma das tarefas mais difíceis é acompanhar individualmente de que modo cada um deles reage/responde/incorpora as experiências da educação coletiva. 


Sabemos que a educação infantil oportuniza a convivência entre coetâneos e crianças de outras idades e que a exposição diária ao compartilhamento de objetos, brinquedos, espaços, e da atenção dos adultos gera conflitos que devem ser administrados. A esta “administração” quero chamar de intervenção pedagógica, que por ser pensada, sistematizada e organizada intencionalmente, surte um tal efeito, hoje tema de inúmeras pesquisas na área da Educação Infantil. Esse efeito é a capacidade que uma criança constrói, desde muito pequena, de desenvolver sua inteligência e personalidade “se” ela encontrar as condições favoráveis na instituição que frequenta. 

A esta altura do ano, com a aproximação da construção do primeiro texto que se caracteriza como o que vai informar aos pais o acompanhamento do processo educativo das crianças durante o primeiro semestre, faz-se necessário que se reúnam elementos para proceder essa análise. Ao mesmo tempo que esse é um argumento importante, existe ainda um outro: a visibilidade e a invisibilidade das crianças em suas vivências cotidianas, ofuscadas muitas vezes pelos atropelos que nos exigem e tomam a atenção. 

Sinto necessidade de prestar atenção em cada criança em especial, por um dia inteiro ou pelo período que permanece conosco, fotografando-a e anotando o que ela fez naquele dia em que a coloquei em foco. Não tenho em mente que o dia de cada criança seja o melhor vivido e sim, que o dia em que ela estiver em foco, eu tenha concentração e discernimento de prestar-lhe atenção a ponto de fazer uma avaliação do que se apresenta. 

Parece-me um compromisso inalienável por parte do profissional da educação infantil que ele se debruce sobre essa tarefa como aquela que, no fundo no fundo, fala de sua própria capacidade de observar as crianças e de selecionar aquilo que as representa, bem como de redigir o texto que faça a síntese.   


quinta-feira, 12 de maio de 2016

Um olhar sensível sobre o grupo de crianças: os adultos como parceiros desejáveis

A inserção da criança na Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, tem sido cada vez mais possível na maior parte dos municípios brasileiros. Estima-se que haja ainda muitas crianças a atender e se temos a crença de que a sua frequência é um diferencial na vida delas, isso complexifica nosso papel como profissionais dessa instância.

Quando as crianças nos chegam trazem já experiências e vivências diversas. Não nos cabe compará-las pensando que por terem nascido todas no mesmo ano, elas comportar-se-ão da mesma forma.

Ao observá-las bem de perto vemos reações muito ímpares mas todas um dia já registradas por estudiosos da área. Chorar muito e um pouquinho; gritar com todos os pulmões ou soluçar; colocar todo o pedaço de bolo na boca ou jogá-lo longe; comer como se fôssemos todos velhos conhecidos; bater em quem se aproxima ou aconchegar-se tristemente; deixar ser consolado ou empurrar quem está perto demais; morder ou beijar; ficar imóvel ou chorar no portão querendo saber por que a mãe a deixou aí; sentar e ouvir história, olhando, sorrindo ou se incomodando que as pernas do amigo estão encostadas nas suas; chorar porque, afinal, estão quase todos fazendo isso e se imitar é a lei da aprendizagem, então choramos juntos... Essas são algumas das reações das crianças recém-chegadas e ainda muitas semanas após o início dos trabalhos.


O que oferecer às crianças nos dois primeiros meses, reconhecidamente o período de familiarização com novos parceiros, adultos e crianças? Como proceder para abreviar o mal-estar pela separação dos pais, esses adultos amados e de confiança?

É preciso lembrar que cada criança percorre um processo individual de familiarização com o novo ambiente e o que funciona para uns, não repercute para outros.

Em minha prática, no primeiro mês em que novas crianças vem compondo a turma até chegar ao número dezesseis por período, percebi que os bebês têm necessidades, a maioria determinada pela condição cronológica. As seis crianças que têm menos de um ano e quatro meses requerem cuidados na condução pelos espaços do Centro e demonstram sua insegurança pelo novo ambiente através da expressão de estarem perdidos quando nos dirigimos ao parque, ao refeitório, ao solário. Dentre eles, porém, notamos uma criança que está demonstrando bom manejo da colher e do copo. Os demais precisam ser alimentados e estão começando a conhecer o uso social do talher, do prato e do copo.


Das nove crianças de um ano e quatro meses até os que completaram um ano e meio, apenas um se alimenta sozinho e bebe do copo com habilidade. Os demais também precisam ser alimentados, ainda que estejam iniciando o processo de levar à boca o alimento com a colher. Esse pequeno grupo está necessitando de mais tempo para se familiarizar com as atividades que ocorrem em outros espaços pois manifestam muitos momentos de desconforto, expressando-se pelo choro. Das cinco crianças que estão acima de um ano e meio, apenas uma está ainda bastante insegura no ambiente, chorando quando novos adultos frequentam a sala.

Interessante registrar que as destrezas motoras não estão explicadas pelo desenvolvimento físico. Entre uma das crianças que é do mês de dezembro e outra que nasceu em junho, existe uma enorme diferença. A primeira, mais jovem, faz e acontece; a outra, de junho, não consegue erguer a perna para subir no cavalinho. São as experiências e vivências diversas que essas crianças tiveram.

Dada essa enunciação da diversidade entre as crianças, uma pequena amostra apenas para justificar as escolhas que deverão ser feitas, podemos pensar no que temos oferecido até agora a elas e o que precisamos oferecer, uma vez que o objetivo da Educação Infantil é ampliar as experiências das crianças.

Organizar um espaço, que não seja uma sala desnuda, com objetos como livros, brinquedos, móveis foi o início. Mas, passado um mês de convívio com algumas crianças, percebe-se a necessidade de apresentar outros desafios.

Deixar as crianças interagir com o que já está exposto é uma atitude frequente. Mas é preciso levar novos objetos e brinquedos para que elas possam conhecer e criar brincadeiras. Por isso, será necessário continuar providenciando pelo menos:

 A organização de um espaço para que as crianças se sintam desafiadas a descobrir os efeitos de manipulação.


- O oferecimento de objetos e brinquedos que agucem a curiosidade.
- O acompanhamento das crianças nas brincadeiras, conversando, instigando-as oralmente.
- O respeito pela individualidade das crianças, aconchegando-as nos momentos em que demonstrarem desconforto emocional.
- O desenvolvimento da paixão pelos livros, contando histórias e descrevendo as imagens com detalhes, assim como na ampliação do vocabulário das crianças, investindo nos diálogos constantemente e no canto de músicas infantis.
- A estimulação para a manipulação de texturas, como tintas comestíveis, para ampliar a sensação tátil, uma vez que o corpo é um poço de possibilidades de aprendizagem.

O trabalho do profissional da Educação Infantil não pode ser solitário. Há de se planejar coletivamente as ações. Mas esse é um dos capítulos mais difíceis da história. Não sei porque estamos demorando tanto para levar a sério que juntos conseguiremos avançar mais do que em solidão. Talvez tenhamos que esperar um decreto governamental. Lamentável!



quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Penso, logo planejo

Ainda em férias...
Vou à sacada e observo o mundo, o de dentro e o de fora de mim.
O sol dá ao dia uma luminosidade renovada. Deve ter feito mil promessas na noite de ano novo.
As árvores, os arbustos, as flores me dão a impressão de muito vivos e dispostos.
E eu, como estou?
Quando olho a mim mesma, o que percebo?
O que me dou neste dia e nos demais do ano que me farão brilhar, sorrir, encantar e seguir confiante?
Estou contando os feriados no calendário?
Planejo meus finais de semana ainda na estação do verão?
Penso em como economizar minhas energias e "aguentar" a árdua tarefa de ser professora?
Que pensamentos povoam meu cotidiano antes do recomeço do ano letivo?
Aproveito até o último minuto e faço de conta que não vai mexer comigo encontrar as crianças?
Adio as expectativas em relação ao meu novo grupo, afinal, devo respeitar meus últimos dias de férias?

Penso em outros profissionais e imagino que eles estão mais tranquilos do que eu e se saem melhor nos níveis de ansiedade diante da desafiante tarefa de se responsabilizar por crianças tão pequenas?
Por que estou lendo uma tese sobre documentação pedagógica?
O que pretendo privilegiar em 2016 que me dará satisfação e motivos para ir ao encontro de meu grupo de crianças?



Quais são minhas intenções ao me ater ao pensamento de que o que faço tem uma importância crucial na formação humana de meu novo grupo de crianças?


O que farei com o que faço todo dia com elas?


Como vou qualificar minha atuação e tornar o cotidiano mágico e interessante para as crianças e as demais adultas que trabalharão comigo?
Como gostaria que fossem documentados nossos encontros para que não se caracterizem apenas como uma tarefa exaustiva e sim transbordante de significado?

É que eu não sei não sonhar. O sonho é sobre o medo também, porque pensar sobre tudo dá muito medo. Quem tem medo se pega a pensar.

"Tudo que não invento é falso. Meu medo é inventado. Pode haver mais medo de fracassar do que as chances de errar que imaginamos?" (SIMIANO, 2015, p. 38). 

E nessa leitura*, que faço hoje, acho muitas respostas e consolo meu medo. Meu medo é meu respeito. Meu respeito é pelas crianças e pela minha profissão. Sigo lendo, garimpando ideias e novos olhares sobre antigas questões. O tesouro será construído aos poucos. Na reflexão e na renovação. Comecemos acreditando.

* Tese de Doutorado de Luciane Pandini Simiano: "Colecionando pequenos encantamentos... a documentação pedagógica como uma narrativa peculiar para e com as crianças bem pequenas", Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Orientadora: Profª. Dra Maria Carmen Silveira Barbosa. 2015.